Rodopiou em seu equilíbrio e desenhou uma esfera ao seu redor. Mais uma vez acabou na redoma invisível com lugar para uma só pessoa. Quis dividir o espaço e não tinha a quem chamar, gritou e ninguém respondeu. Tirou as sapatilhas, jogou contra a parede com a maior força do mundo, acertando o espelho que rachou em milhões de pedaços.
Tinha o coração cansado e os pés moídos de ensaios sem apresentações, tinha os sentidos fartos de tanto se guardarem para o final que nunca chegava. Conhecia bem a dor de quem dança sozinho uma dança de se dançar a dois. Conhecia o medo e a ilusão como se estes fossem seus grandes companheiros da vida.
Invejou a simplicidade daqueles que desconhecem seus próprios pensamentos. Por um momento quis cair sem encontrar chão pelos próximos 20 segundos, talvez mais. Desejou um pouco de adrenalina e medo da morte pra se sentir viva, depois sorriu por sabê-lo absurdo.
Buscou as sapatilhas do outro lado do salão, guardou na bolsa e calçou os tênis. Viu seu reflexo rachado e sentiu-se bonita cortada em vários pedaços. Pensou que essa imagem era mais real do que qualquer outro espelho, dividida em partes e partida ao meio. Espetou o dedo na ponta de um caco afiado só para ver o vermelho formar uma bolha. Apagou as luzes, apagou as memórias. Vestiu um sorriso e foi pra casa fingir que tudo estava bem.